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  • Ronaldo Costalunga Gotuzzo

O direito à reintegração do servidor público

Atualizado: 15 de jun. de 2021

Enquanto a nefasta “reforma administrativa” (PEC nº 32/2020) arquitetada pela atual Administração Pública Federal não vinga, nossa Carta Constitucional de 1988 – tal qual assegurado desde a Constituição de 1934 –, segue prevendo em seu art. 41 que o servidor nomeado para cargo efetivo mediante aprovação em concurso público, após cumprido o estágio probatório de 3 anos, (§1º) somente perderá o cargo em (i) virtude de sentença judicial transitada em julgado; (ii) mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa; e (iii) mediante processo de avaliação periódica de desempenho, na forma da lei, assegurada ampla defesa. Trata-se do incompreendido direito à estabilidade, que consiste na garantia à permanência no serviço público, após cumpridos os requisitos legais, para que o servidor possa atuar livre de pressões político-partidárias do governante em exercício ou do temor de qualquer tipo de represália.


Por sua vez, demitido o servidor público estável, e essa demissão venha a ser declarada inválida, seja por força de decisão judicial, seja por ato da própria Administração Pública (poder-dever de autotutela), nasce o direito a sua reintegração ao serviço público (art. 41, §2º).


Os estatutos dos servidores públicos civis, como regra geral, prevêem expressamente o direito à reintegração. Vejamos:

  • Lei Federal nº 8.112/1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos da União): A reintegração é a reinvestidura do servidor estável no cargo anteriormente ocupado, ou no cargo resultante de sua transformação, quando invalidada a sua demissão por decisão administrativa ou judicial, com ressarcimento de todas as vantagens (art. 28, caput).

  • Lei Complementar Estadual (RS) nº 10.098/1994 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio Grande do Sul): Reintegração é o retorno do servidor demitido ao cargo anteriormente ocupado, ou ao resultante de sua transformação, em consequência de decisão administrativa ou judicial, com ressarcimento de prejuízos decorrentes do afastamento (art. 43, caput).

A reintegração é, portanto, uma forma de provimento de cargo público derivado por reingresso, decorrente do reconhecimento da ilegalidade de seu desligamento.


Segundo o Superior Tribunal de Justiça (Recurso Especial nº 85.360/DF, relator Min. William Patterson) a reintegração é a reparação integral dos direitos, uma vez que é desfazimento de ato ilegal.


Ponto relevante da reintegração, então, e que exige máxima atenção, é justamente quanto ao ressarcimento integral dos prejuízos decorrentes do afastamento. Isso porque, se a demissão foi tida como ilegal, sua invalidação deve produzir efeitos ex tunc, ou seja, deve retroagir à data em que foi praticado o ato ilegal. É, portanto, impositivo que a Administração recomponha integralmente o patrimônio (inclusive funcional) do servidor lesado (restitutio in integrum).


Neste sentido, por exemplo, os mesmos Estatutos já anteriormente citados, trazem em seus dispositivos que tratam dos efeitos do julgamento de procedência da revisão administrativa do ato disciplinar-sancionador, a necessidade de pleno restabelecimento dos direitos do servidor ilegalmente afastado:

  • Lei Federal nº 8.112/1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos da União): Julgada procedente a revisão, será declarada sem efeito a penalidade aplicada, restabelecendo-se todos os direitos do servidor, exceto em relação à destituição do cargo em comissão, que será convertida em exoneração (art. 182, caput).

  • Lei Complementar Estadual (RS) nº 10.098/1994 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio Grande do Sul): Julgada procedente a revisão, será declarada sem efeito a penalidade aplicada, restabelecendo-se todos os direitos do servidor (art. 254).


Vamos, então, recorrer a um hipotético caso prático, a fim de ilustrar devidamente no que consiste tal reparação integral: imaginemos um servidor público estável de determinada carreira organizada em 5 classes, ocupante da 2ª classe dessa carreira, e que veio a ser demitido, por força de condenação em processo administrativo disciplinar (PAD), em março/2013. De imediato, em abril/2013 ele ingressa com uma ação judicial na qual objetiva a declaração de nulidade deste PAD. Apenas em junho/2021, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o processo alcança seu trânsito em julgado, com a declaração de nulidade do PAD, e, como consequência, de sua demissão. O servidor público é, então, reintegrado ao serviço, em julho/2021, na mesma 2ª classe que ocupava quando da demissão (março/2013), com o que a Administração entende como plenamente cumprida a decisão.


Ora, evidente que a mera reintegração, mais de 8 anos após a ilegal demissão, na mesma classe ocupada à época, está muito distante de ser entendido como reparação integral dos prejuízos, ou o ressarcimento de todas as vantagens. Há que se buscar, então, perante a Administração Pública, primeiro, o devido reconhecimento do tempo de afastamento (março/2013-julho/2021) como de efetivo serviço público e, juntamente com tal reconhecimento, a devida equalização dos reflexos desse tempo na vida funcional do servidor reintegrado. Digamos que a Administração tenha efetivado, por exemplo, promoções (por antiguidade) neste período em que o servidor esteve afastado, e que servidores com o mesmo tempo de serviço hoje estejam, não mais na 2ª, mas tenham sido promovidos em 2014 para a 3ª classe e em 2018 para a 4ª classe. Há que se provocar a Administração para que ela reconheça, de maneira retroativa, também tais promoções ao servidor reintegrado. Imagine-se, também, que, por exemplo, o Estatuto que rege o cargo de tal servidor, preveja avanços para cada triênio de serviço. Tais deverão ser computados também retroativamente. Deverão, ainda, ser computados os períodos aquisitivos de férias e, se previstos na legislação, também os períodos de licença-prêmio. Imaginemos, ainda, que o servidor, neste tempo em que esteve afastado, tenha implementado os requisitos necessários para a sua aposentadoria. Terá, a contar da data da implementação destes, também, o direito ao abono de permanência.


Portanto, a reparação integral do prejuízo decorrente do afastamento ilegal vai muito além do mero reingresso no serviço público com o pagamento da remuneração correspondente, que deve ser adimplida acrescida de juros e correção monetária. Exigindo, assim, seja do próprio servidor, seja de seu defensor constituído, atenção para que sejam alcançados todos os vencimentos e vantagens ao reintegrado como se não tivesse ocorrido o seu ilegal afastamento.

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